Artigo | Dia do Rio | Por Wilson Acácio


23 nov/2017

O Dia do Rio

 Por Wilson Acácio*

Os recursos hídricos constituem um bem natural de valor ecológico, social, econômico e cultural, cuja utilização deve ser orientada pelos princípios do desenvolvimento sustentável. As nossas mãos podem destruir a natureza ou torná-la cada vez mais saudável, produtiva e protegida. No passado histórico, na área da Bacia Hidrográfica do Rio Caratinga, principalmente em função da cultura cafeeira, constituiu-se uma das áreas de Minas Gerais onde as “nossas mãos” mais destruíram os ecossistemas nativos existentes, inclusive os recursos hídricos.

Como no dia 22 de março comemora-se o Dia da Água, no dia 24 de novembro foi instituído o Dia do Rio, objetivando conscientizar os nossos governantes, empresários e a sociedade em geral sobre a preocupação que devemos ter em relação a grande escassez da água em muitos rios brasileiros – em 2017, incrivelmente, os rios Araguaia e Tocantins, em plena Amazônia, estão praticamente secos.

Historicamente, a quase totalidade das civilizações e das cidades foram construídas às margens dos rios, aproveitando de suas águas para as mais diversas atividades (abastecimento humano, dessedentação de gado, saneamento básico, pesca, irrigação, navegação, geração de energia, lazer  etc.).  Desde os tempos remotos, estabeleceu-se uma cultura de se jogar nas águas servidas dentro dos rios, com a falsa ideia de que eles não sentiriam os impactos de tal ato. Após o advento da Revolução Industrial, aliado ao intenso processo de urbanização após a década de 1960, inclusive nos países subdesenvolvidos, as cidades cresceram e a quantidade de esgoto também.

O que se detecta é que a vazão dos rios, em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil, não foram e não são suficientes para depurar a sujeira neles lançadas. Tristemente, pelo país afora, em vez de rios, o que encontramos são verdadeiros esgotos a céu aberto, sem nenhum tratamento, com fluxo de águas escuras e fétidas, com pouca ou nenhuma diversidade de vida, a não ser de bactérias anaeróbias que “perfumam” o ar de nossas cidades com aquele nauseante cheiro de ovo podre!

Outros problemas juntam-se aos esgotos, como o grande fluxo de águas para o interior dos rios, durante o período de chuvas, devido a indiscriminada impermeabilização das ruas de nossas cidades. Como consequência, há um aumento considerável de erosões e assoreamento, criando um ciclo vicioso de destruição do rio que avança sem obstáculos, provocando, muitas das vezes, enchentes catastróficas, dizimando muitas vidas humanas. Para atenuar ou tentar resolver este problema, as prefeituras realizam obras de retificação e de canalização do leito do rio que,  muitas vezes, acabam por serem mais danosas tanto ao rio quanto ao próprio ambiente da cidade. Além disso, estas obras geram a extinção da flora e da fauna antes existentes nas margens dos rios. Os resíduos sólidos também constituem numa praga que assola o ambiente hidrográfico das cidades, seja pela falta de consciência da população ou pela inépcia do poder público.  Desgraçadamente, assistimos os nossos rios tornarem-se numa “grande lata de lixo”, com resíduos de todas as espécies: embalagens de plástico, papelão, potes de vidro, garrafas PET, jornais e revistas, objetos de metal, roupas, pneus, sofás e, por incrível que pareça, até automóveis inteiros!

Nesta data, em que se comemora o Dia do Rio, não podemos nos esquecer de que no dia  5 de novembro de 2015,  nas águas do Rio Doce,  aconteceu  o maior desastre ambiental do Brasil, com o maior vazamento de rejeitos minerais do mundo, quando  rompeu a Barragem de Fundão, em Mariana (MG). Esta tragédia anunciada provocou inúmeros impactos sócio-econômicos-ambientais-culturais jamais vistos em todo o nosso planeta! O mais lamentável de tudo isto é que dezenove pessoas perderam suas vidas e, os (ir) responsáveis por tudo isso continuam soltos!

Que esse 24 de novembro seja um dia de reflexão e de tomada de consciência da importância da preservação, proteção e, principalmente, da recuperação de nossos cursos d’água. Ah, o nosso Caratinga, bem como os seus inúmeros afluentes (córregos e ribeirões), localizados nos diversos municípios componentes de sua bacia hidrográfica, não fogem à regra de tudo de ruim que estamos fazendo com os nossos rios!

*Wilson Acácio, professor aposentado (UFJF), mestre em Geografia (UFRJ), representante da Doctum no CBH-Caratinga, do qual é vice-presidente, e membro da diretoria colegiada do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce.